Esta tese de doutorado, orientada pelo Prof. Dr. Fernando Aguiar, foi resultado de meu desejo de trabalhar o tema da angústia na clínica psicanalítica – algo que mobiliza o psicanalista e provoca interrogações diversas na análise de pacientes – e, ao mesmo tempo, estudar em profundidade o texto freudiano Das Unheimliche (1919), traduzido na Edição Stardard brasileira como “O Estranho”. Seguindo o fio condutor da obra de Freud e, também, do décimo seminário de Lacan, teci articulações entre a angústia e o Unheimlich, mostrando formas em que esses conceitos podem se iluminar mutuamente. Para tanto, também lancei mão de articulações com a literatura e o cinema de horror, tal como feito por Freud em relação ao conto “O Homem da Areia”, de E.T.A. Hoffmann, entre outros.
Assim, considero este trabalho uma homenagem singela a Das Unheimliche, esse pequeno texto freudiano tão absolutamente inspirador para a leitura psicanalítica da cultura e, conforme tentei mostrar, tão igualmente essencial para a clínica psicanalítica. Ademais, a partir das coordenadas de Das Unheimliche, este trabalho homenageia também a literatura e o cinema de horror como metáforas da angustiante relação do sujeito com o Outro, daí o título desta tese: “O horror e o Outro”.
RESUMO: Esta tese objetivou caracterizar a importância do artigo freudiano Das Unheimliche (1919) para a compreensão das teorias da angústia em Freud e Lacan. Com esse enfoque, o trabalho percorreu os principais textos freudianos sobre a angústia, assim como o décimo seminário de Lacan. Os vínculos entre o Unheimlich (aqui traduzido como “o sinistro”) e a angústia foram desenvolvidos por meio de três grandes eixos que enfatizam a relação do sujeito com o outro especular, com a castração e com o desejo do Outro. Paralelamente, o trabalho dialogou com a ficção de horror na literatura e no cinema. As respostas encontradas demonstraram uma interpenetração dos campos da angústia e do sinistro, cujos conceitos esclarecem-se mutuamente. Em primeiro lugar, enfatizou-se a figura sinistra do duplo presente na ficção de horror como ilustração maior do caráter angustiante e ambivalente presente na relação do sujeito com o seu semelhante. Na sequência, demonstrou-se como o Unheimlich constitui um campo de provas privilegiado para a tese freudiana da fantasia de castração como motor fundamental da angústia. Finalmente, abordou-se, com Lacan, o Unheimlich como expressão fenomenológica da angústia do sujeito perante o desejo do Outro. O sinistro é, enfim, a forma paradigmática da angústia sinal primeiramente teorizada por Freud, alertando o sujeito acerca do perigo de sua posição desamparada de objeto para o desejo e para o gozo do Outro. Para produzir a passagem do tempo do gozo ao tempo do desejo na clínica psicanalítica, observa-se a necessidade da travessia do caráter sinistro da fantasia fundamental, o que leva à queda do Outro consistente ou “monstruoso”.